Armação da Praia do Barril | Tavira


Situada na Praia do Barril (Pedras d’el-Rei/Tavira) a Armação do Barril, ou dos Três Irmãos, terá sido fundada no ano de 1841, tendo funcionado até ao ano de 1966. Hoje, a praia é conhecida, sobretudo, pelo seu singular “cemitério de âncoras”, utilizadas para fixar a terra as já desactivadas armações de pesca do atum e da sardinha.

As armações eram uma arte de pesca do tipo armadilha fixa, de grande extensão, aberta ou não à superfície. Constituídas por redes verticais sustentadas por estacas, bóias, cabos e âncoras, armando uma série de canais, barreiras e câmaras, através dos quais os peixes eram conduzidos até ao “copo”. Dividiam-se geralmente em diversos compartimentos podendo, ou não, ser fechados na base por um pano de rede. As Armações tiveram grande importância na pesca do atum e da sardinha, contribuindo significativamente para o desenvolvimento da industria conserveira em Portugal. As armações da sardinha duraram menos tempo que as armações do atum, a última instalação destinada ao atum, no Cabo de Santa Maria, encerrou a sua actividade em 1968. O desaparecimento das armações do atum deveu-se, não só a questões de rentabilidade económica, mas também, e sobretudo, a um progressivo afastamento do atum em relação à costa. As armações do atum eram mais vulgares na costa algarvia, embora na costa ocidental também tenha existindo algumas: Cabo de São Vicente, Arrifana, Pedra e Ponta da Galé, Setúbal/Sesimbra, Cabo Carvoeiro, etc.).

«O atum é um peixe migratório que na primavera inicia uma rota desde o Atlântico até ao Mediterrâneo, culminando no Mar Negro, tendo como única passagem o estreito de Gibraltar. Como o atum é bastante tímido e assustadiço ao ver as negras redes de pesca eriçadas, impermeabilizadas em alcatrão, numa estrutura fixa por âncoras e bóias que mais parecia um dédalo de corredores ou de ladrilhadas muralhas medievais, afastava-se para um canal que o conduzia até ao “copo”, uma espécie de armadilha de onde não podia sair senão fisgado na ponta do arpéu dos pescadores, debruçados sobre as redes numa luta desigual entre a força e o engenho, à qual eufemísticamente chamaram a tourada do mar”, mas que não passava dum verdadeiro ritual de sangue».

«As armações lançadas no Algarve eram verdadeiras obras de engenharia náutica, bastante onerosas, constituídas por quilómetros de redes, centenas de âncoras e milhares de bóias, dando trabalho e pão a inúmeras famílias de pescadores. A tradição desta pesca passava de pais para filhos. Conforme o regime dos ventos oscilava também a limpidez das águas, sendo tanto mais proveitosa quando mais cristalinas fossem as águas. E isto porque o atum, embora bastante corpulento era muito assustadiço preferindo marginar as redes em vez de investir contra elas, sendo por isso imprescindível que as visse, razão pela qual as águas teriam de estar límpidas. Caso contrário esbarravam na armação danificando a sua estrutura, mercê da confusão que a partir dali se estabelecia no grupo de tunídeos. Pior do que isso seria a entrada do roaz na armação, expressão que o povo consagrou como sinónimo de grande confusão ou de violenta perturbação da ordem. O roaz é um pequeno cetáceo de apenas 1,5 metros de comprimento, bastante voraz, que persegue os atuns para num golpe de agilidade e força lhes arrancar o fígado, muito rico em gorduras. Um cardume de atuns, perante o ataque do roaz, é capaz de investir contra a armação e infligir-lhe danos irreparáveis. A presença do roaz na costa algarvia poderia significar a perda de um ano de trabalho. Por isso existiam barcos avançados à armação, como se fossem vigias para afugentar os roazes».

«As armações de pesca do atum achavam-se espalhadas por toda a costa do Algarve, pertencentes a grandes empresários ou a sociedades de investidores. Sabe-se que pelo menos em 1797 fainava nestas águas a Companhia de Pescarias do Algarve, fundada anos antes pelo Marquês de Pombal».

«O recorde das capturas por redes de cerco pertence às armações do Barril e Medo das Cascas, que no ano de 1881 pescaram respectivamente 46.825 e 40.729 atuns, de direito e de revés».

José Carlos Vilhena Mesquita


1841 to 1966



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